Conheça os fundos de ações e long biased mais rentáveis no ano – Valor Investe , 27 de outubro de 2020

Por Naiara Bertão, Valor Investe — São Paulo

Para a maioria dos gestores de investimentos, o ano de 2020 já poderia acabar. Seja porque a performance está bem aquém do que eles esperavam ter ou porque, em um ano tão turbulento e incerto, estão conseguindo ir até bem, melhor que o índice de referência. E teve quem conseguiu sim se dar bem em meio a tudo isso.

Um levantamento feito pelo economista e blogueiro do Valor Investe Marcelo d’Agosto, mostra que, em média, os 10 fundos de ações que melhor performaram nos nove primeiros meses do ano renderam 12,4% contra uma dolorosa queda de 18,2% do Ibovespa no períodoEm 12 meses, renderam 26,3% ante -9,7% do índice de referência.

Quem mais surpreendeu positivamente, o fundo Invexa Inter + IBOVESPA Ativo FIA, rendeu nada mais nada menos do que 48,5%. Dos Top 10, quem deu menor retorno, Forpus Ações FIC FIA, ficou positivo em 1,24%, ainda um grande feito neste ano.

Fundos de ações que se deram melhor em 2020 até setembro

FundosRetorno no ano (%)Retorno em 12 meses (%)Retorno em setembro de 2020 (%)Patrimônio líquido em setembro de 2020Número de cotistas em setembro de 2020
Invexa Inter + IBOVESPA Ativo FIA48,5066,09-10,7499.240.4901.175
Absoluto Advisory FIC FIA29,9843,63-1,11736.550.5891.586
Fator Sinergia FIA24,6141,49-5,43152.530.2341.440
Itaú Personn Seleção Truxt Valor FIC FIA13,7925,58-3,68185.823.9381.273
IP Participações IPG BDR Nível I FIC FIA13,0226,10-4,08238.044.19314.068
CTM Estratégia FIA9,8926,66-0,8183.824.0951.282
Safra Arquimedes BDR Nível I FIA5,1610,38-3,551.310.952.90611.738
BTG Absoluto FIC FIA5,0514,17-2,011.376.729.1452.458
Constellation Institucional FIC FIA2,4814,84-3,701.078.170.0294.831
Forpus Ações FIC FIA1,7429,57-10,71535.588.17222.635
Ibovespa-18,20-9,68-4,80

Fonte: Morningstar. Elaboração: Marcelo d’Agosto

Também analisamos os fundos do tipo Long Biased, produtos que, além de manter posições compradas em ativos, pode ter posições vendidas, em especial de ações ou índices de ações. Nesta categoria, o quadro foi um pouco menos animador.

Apesar de na lista ter fundo que chegou a subir 28,3% nos nove primeiros meses do ano – caso do Versa Long Biased FIM – a crise afetou tanto esta categoria que cinco dos dez melhores acumulam retorno negativo, ainda que menos pior que o Ibovespa.

Foram avaliados para o levantamento milhares de fundos abertos, negociados em plataformas de investimentos, e que tenham ao menos um ano de existência e 1 mil cotistas. Todos são contemplados no Guia Valor de fundos de investimentos (conheça aqui).

Fundos Long Biased que se deram melhor em 2020 até setembro

FundoRetorno no ano (%)Retorno em 12 meses (%)Retorno em setembro de 2020 (%)Patrimônio líquido em setembro de 2020Número de cotistas em setembro de 2020
Versa Long Biased FIM28,2793,77-19,66233.800.5431.733
Truxt Long Bias Advisory FIC FIM27,5235,48-3,45568.645.0223.076
Versa Fit Long Biased FIM21,9655,69-8,8653.287.7825.240
Occam Equity Hedge FIC FIM4,145,18-0,952.074.293.53037.476
Itaú SeleçãoJGPEquity Explorer30 FIC FIA0,599,49-2,9472.330.6181.259
Moat Long Bias Advisory FIC FIM-1,2410,06-6,5952.971.5661.418
XP Long Term Equity FIC FIM-2,7714,44-1,80817.730.20817.524
BB Long Bias FIC FIM LP-3,760,52-2,39104.652.4413.251
Opportunity Long Biased FIC FIM-4,036,84-3,84266.879.7024.600
Miles Acer Long Bias Advisory FIC FIM-4,423,21-5,30120.536.4251.754
Ibovespa-18,20-9,68-4,80

Fonte: Morningstar. Elaboração: Marcelo d’Agosto

Setembro foi um mês-chave para explicar o que está sendo a pandemia para o mercado de investimentos. Quando até os superconservadores títulos públicos Tesouro Selic (LFTs) rendem menos que zero, algo parece errado. E todos os gestores ouvidos pelo Valor Investe para esta reportagem e para outras do mesmo tipo são unânimes em dizer que a sangria do mês passado é resultado de uma crise econômica, mais um descuido com o Brasil, especialmente na agenda importante de reformas e na vigilância com o fiscal e o teto de gastos públicos.

Como consequência, os investidores pediram um prêmio maior (juro) pelo risco crescente e os títulos se desvalorizaram. Na bolsa, se as trapalhadas de Brasília estavam, em meses, passando longe da recuperação dos mercados, os investidores voltaram a olhar com atenção e receio às tentativas “criativas” de criar um substituto ao Bolsa Família. Nas últimas semanas, teve até quem se arriscou prever que, por causa do fiscal bagunçado e do impacto do auxílio emergencial na inflação, o Banco Central pode subir os juros antes do previsto, nas próximas reuniões.

Se entre maio e agosto a visão do mercado estava menos nebulosa e as esperanças de que sairíamos dessa melhor do que prevíamos em um primeiro momento, em setembro a volatilidade voltou. Vale ainda lembrar que a segunda onda de casos da covid-19 no mundo, em especial Europa, também preocupa no exterior e interfere aqui.

Mesmo para gestores cujo foco é o mercado de ações, entender o que está acontecendo ao redor, prever possíveis movimentos de juros e câmbio e interferências políticas, faz parte da análise.

Diante de tudo isso, se deu bem quem estava protegido no fim de fevereiro, quando o Brasil entendeu que não passaria ileso ao vírus, quem tinha caixa e foi ágil o suficiente para aproveitar as oportunidades de comprar ações muito baratas que a crise trouxe e quem acertou a mão na escolha de setores e ações vencedoras

Foi assim que as gestoras ouvidas pelo Valor Investe ganharam dinheiro este ano, até agora.

A Invexa Capital leva, por ora, o título de gestora cujo fundo Invexa Inter + IBOVESPA Ativo FIA, apresentou o melhor desempenho entre todos os produtos analisados pelo Valor Investe nos nove primeiros meses do ano.

Margem de manobra e boas escolhas

Segundo Marcelo Weber, sócio da gestora, o fundo tem duas estratégias predominantes, sendo a mais importante e que responde por dois terços do patrimônio, o investimento em ações com potencial de crescimento, não apenas na bolsa, mas de receita e lucro, escolhidas por meio de análise fundamentalista.

“O cenário macroeconômico é muito importante para a gente. Nesse cenário macro, acabamos fazendo análise ‘top down’, ou seja, avaliamos o que está acontecendo e como isso vai impactar setores individualmente e, a partir daí, definimos setores e quais empresas dentro deles têm um grau de destaque e valorização”, explica Weber.

Já o terço restante do patrimônio é usado para montar posições táticas, de curto prazo, para aproveitar distorções momentâneas de preços, ou seja, quando a ação da empresa está valendo menos do que a gestora acredita que ela merecia valer. Neste caso, as posições podem ficar na carteira por dias ou semanas, mas não por um período muito longo.

“O que foi um bom gerador de alfa para a carteira historicamente foram posições em bancos médios, empresas do setor de energia elétrica, setor médico e empresas de e-commerce, como Magazine Luiza e Via Varejo”, comenta o sócio.

Em energia elétrica, ele cita as empresas Eneva e Ômega, que também compõem o portfólio há mais tempo, ainda que não sejam tão representativas hoje quanto já foram no total da carteira. No setor financeiro, a gestora gosta de Banco Inter e B3, que tem se beneficiado indiretamente da queda de juros, com recorde de novos investidores. Uma das principais apostas agora é construção civil.

Mas é o varejo que ainda brilha os olhos dos gestores da InvexaO segmento responde por 10% do patrimônio líquido do fundo, que conta hoje com cerca de 30 ativos no total. Apesar de já ter vendido os papéis da Magazine Luiza, a Via Varejo ainda é uma posição importante do fundo. O motivo da aposta está no crescimento do comércio eletrônico na pandemia e na mudança de hábito de compra do brasileiro.

Para se proteger, o movimento foi se posicionar comprados em papéis mais resilientes, como os da mineradora Vale, e vender os que já previam que sofreriam mais como a agência de viagens CVC, e companhias aéreas, ambos setores – turismo e viagens – bastante impactados pela restrição de locomoção e isolamento social.

Empresas vencedoras

Um dos pontos em comum entre as gestoras de ações que se deram bem foi a aposta – bem acertada – no crescimento do varejo. Magazine Luiza, Via Varejo e Mercado Livre são alguns dos nomes mais citados de papéis que deram alegria aos gestores. Na falta de muitas empresas de tecnologia, as apostas se voltaram no Brasil para as varejistas que focaram no comércio eletrônico.

Além da Invexa, as gestoras Truxt, Versa e Moat também se beneficiaram de posições em empresas do setor.

“A nossa história desse ano não é uma história de estar ‘short’ [vendido] no mercado e o coronavírus tem ajudado. Durante a crise acabamos apanhando bastante, mas gostamos de montar posição quando o mercado está estressado; gostamos de distorções de ‘valuation’ e na crise tiveram muitas. Aproveitamos isso ao longo do semestre e conseguimos montar posições vencedoras”, explica Cassio Bruno, gestor de investimentos da Moat.

Nem sempre um ou outro setor se destaca mais. Mas na pandemia não apenas o varejo puxou o fundo para cima, como uma ação em especial: a Via Varejo, dona da Casas Bahia e Ponto Frio. O fundo já tinha uma posição comprada na empresa e, quando os mercados despencaram, aproveitaram para comprar ainda mais. Do início de março para cá, a ação da Via Varejo se valorizou 46%.

Outra vencedora que também cresceu no portfólio do fundo durante a pandemia foi a ação da empresa de telecomunicação Oi, que desde março subiu 72%. “Uma posição que gostamos é a Oi BR, comprados em Oi e vendidos em Ibovespa. Aumentamos bastante ao longo da crise e fomos bastante vencedores também”, explica Bruno.

Na outra ponta, a Moat também deu uma tacada vencedora ao ficar vendida nas ações da resseguradora IRB, que passou este ano por uma série de questionamentos sobre governança e suspeitas de fraudes na contabilidade, que levaram, inclusive, a uma mudança na gestão.

“Já estávamos ‘short’ em IRB há um bom tempo e este ano deu certo. Zeramos toda a posição quando a ação deveria estar valendo R$ 15. Achávamos que ainda tinha ‘downside’ [potencial de cair ainda mais], mas zeramos naquela época”, explica Cassio Bruno. Do início do ano até agora o papel do IRB se desvalorizou 83%, passando de R$ 39,89 em 2 de janeiro para R$ 6,92 no fechamento de 22 de outubro.

Com uma equipe de 11 pessoas só para analisar as ações que vão compor os portfólios de renda variável dos fundos, a Truxt Investimentos foi uma das gestoras que se beneficiou da valorização da Magazine Luiza e Mercado Livre e agora aposta também em B3 e na XP Inc, como empresas que se beneficiam do crescimento do interesse por investimentos no Brasil.

“No início da crise, caiu tudo ao mesmo tempo, coisas boas e ruins. Algumas ações ficaram muito baratas. Reduzimos risco rapidamente e garimpamos oportunidades, até de ações que já tínhamos, mas que estavam a um preço muito atraente”, conta José Tovar, presidente e sócio-fundador da Truxt, cujo fundo Truxt Long Bias rendeu 27,5% no ano até setembro.

Proteção

Em momentos de turbulência é que o mercado vê quem estava de calças curtas. Não que não houvesse motivo no início do ano de estar otimista, tudo parecia caminhar muito bem e havia quem previsse um Ibovespa acima de 200 mil pontos no fim de 2020.

Bom, nem precisamos dizer que ninguém previa uma pandemia no meio do caminho, mas quem soube ver sinais vindos lá de fora e já se preparar para algum problema, se deu melhor.

A gestora Versa, por exemplo, é uma das que entrou no feriado de Carnaval com proteções até nos dentes. Não é para menos, seu fundo Versa Long Biased FIM é bem volátil devido à alavancagem. No início da pandemia, a decisão foi aumentar a parte do fundo que têm ações vendidas a descoberto para neutralizar a posição que está comprada, esperando a alta das ações.

Para proteger a carteira, a gestora geralmente vende índice futuro, como o BOVA11, ETF que replica o índice Ibovespa, e S&P 500, da bolsa americana. “A intenção é trazer a exposição líquida da carteira para perto de zero”, explica Luiza Alves, sócio e gestor da Versa.

Além disso, uma parte do prêmio que ganha na valorização a gestora pode usar para comprar opções, contratos com o direito de comprar ou vender um ativo. No início da crise a Versa usou esse instrumento para zerar a alavancagem do fundo.

“Passamos a primeira fase de queda mais aguda da pandemia bem protegidos. Reduzimos as proteções depois das múltiplas quedas do Ibovespa, próximo aos 80 mil pontos, e recompomos a carteira comprando ações. Zeramos precocemente porque a bolsa caiu para a casa de 60 mil pontos e nessa segunda queda fomos pegos totalmente desprotegidos, mas ainda sem alavancagem direcional por causa das opções”, diz o gestor.

Depois, com a recuperação, a valorização das ações compradas mais do que compensou o prejuízo e a gestora voltou a alavancar o fundo. O Versa Long Biased FIM rendeu 28,3%, o melhor da categoria Long Biased, enquanto seu irmão Versa Fit Long Biased FIM, que tem metade da alavancagem, rendeu 22%.

A perspectiva continua otimista, em especial com os setores de bancos, varejo e construção civil. “Reduzimos bastante commodities e estamos vendidos em dólar; acreditamos que o real não vai se manter nos patamares atuais por muito tempo”, completa o gestor.

Perspectivas

Quando olham para a frente, os gestores ouvidos pelo Valor Investe são unânimes em dizer que estão com boas perspectivas para a bolsa, principalmente considerando que, em dólar, o Ibovespa é o índice mais desvalorizado no ano entre os emergentes.

“Vemos diferença de valor entre empresas de crescimento e empresas de valor, neste último caso geradoras de caixa. Enquanto as empresas de crescimento já performaram bem durante a pandemia, as empresas de valor ainda têm potencial de valorização”, comenta Bruno da Moat. Ao preferir empresas de valor, ele quer dizer que acredita na valorização do setor financeiro, especialmente de grandes bancos, como Itaú, Santander e Bradesco.

A gente vê uma oportunidade grande de comprar setor de bancos. O mercado está pagando um bom preço por empresas em estágio anterior de lucro, ou seja, que geram pouco lucro ainda. Vemos ainda uma certa possibilidade de arbitragem de valor. Vão depender, claro, de esses incumbentes não serem tão afetados”, diz o gestor.

A tese é simples: essas empresas, apesar de sofrerem concorrência crescente de fintechs e bancos digitais, dão ainda muito lucro e o valor de negociação na bolsa está aquém, na opinião do gestor, do que ela vale mesmo.

Ainda vemos muito valor, muito potencial de lucro (nos bancos), e o indicador preço/lucro está bastante baixo. Além disso, também deixa a gente mais otimista pensar que os incumbentes continuam sendo dominantes na parte de crédito porque as fintechs não têm balanço necessário para dar crédito”, diz. Ele cita ainda as provisões de perdas que os bancões já fizeram, prevendo impactos na pandemia e que já foi incorporado no balanço do primeiro semestre.

Mas, depois de um ano como esse, ninguém menospreza os riscos. “O momento que estamos agora vivendo é de apreensão com o fiscal. Tem uma equação que me parece insolúvel que é se arrumar dinheiro para um Renda Cidadã [programa que substituiria o Bolsa Família] com todas as restrições que o presidente colocou. Não quer retirar dos pobres, nem dos funcionários públicos, nem acabar com desonerações… fica com uma equação que, sem furar teto de gastos, dá margem para soluções “criativas” como as apresentadas sobre pegar dinheiro dos precatórios”, comenta Tovar, da Truxt.

Para ele, qualquer programa social deveria ser financiado por redução de despesas públicas e privatizações e jamais, em hipótese alguma, deveríamos estourar o teto de gastos. “Colocamos ‘hedges’ (proteções) principalmente tomados na curva de juros. Já estão com bastante prêmio, mas colocamos para caso o cenário piore”, diz.

A gestora também está tomada em juros americanos, esperando alta, por entender que o título de 30 anos está muito barato. “Isso para caso tenhamos um movimento de inflação lá na frente, para nos defendermos”, completa o sócio.

A preocupação da equipe da Invexa hoje também é, em especial, a aceleração da inflação, um reflexo final da questão fiscal. Por restrições de mandato, o fundo de ações não pode fazer derivativos indexados à inflação, então, para se proteger contra esse risco, a escolha hoje é por papéis que não tenham dificuldade de repassar preços, como os setores bancário e de comércio eletrônico, e apostar em empresas que tenham receita em dólar, como WEG, JBS e Vale.

Energia elétrica é um setor que tem certo ‘hedge’ [proteção] na questão inflacionária, assim como máquinas e equipamento. A gente busca hoje empresas que possam se diferenciar no mercado doméstico. Procuramos ter 20% a 30% da carteira em receitas diversificadas em dólar ou que conseguem repassar preço mais facilmente”, diz Weber, sócio da gestora. Ele acredita que o fundo tem espaço para captar e alocar ao menos mais R$ 500 milhões.